Praia Velha ( São Pedro de Moel )
Mais leve que a pluma
que no ar balança,
pela praia dança
a ligeira espuma.
Dançando se afaga
no alado bailar!
Pétalas de vaga, poeiras do mar...
E na dança etérea,
que imparável ronda!
Bafo de matéria,
penugem da onda.
Afonso Lopes Vieira
***
CANTARES DOS BÚZIOS
Ai ondas do mar, ai ondas,
ó jardins das alvas flores,
sobre vós, ondas, ai ondas,
suspiram os meus amores.
No fundo dos búzios canta
o mar que chora a cantar
ó mar que choras cantando,
eu canto e estou a chorar!
Ai ondas do mar, ai ondas,
eu bem vos quero lembrar:
«a minha alma é só de Deus
e o meu corpo da água do mar!»
Afonso Lopes Vieira
***
A última cantiga (1897) :
Esta palavra saudade
Aquelle que a inventou
A primeira vez que a disse
Com certeza que chorou.
***
- E tão felizes correm os meus dias
E o meu sono é aqui tão descansado,
Que inda espero pagar em agonia
Cada dia de agora, sossegado!
***
A SENHORA D. LEONOR
em S. Pedro de Moel
18 de Setembro
Quando as Santas do Paraíso
fazem anos, nosso Senhor
oferece-lhes sempre em sorriso
dos lábios dos bebés em mar
Elas recebem mil esplendores,
oiros, lesoiros orientais,
mas o que as Santas estimam mais
são os sorrisos e são as flores
***
Penso ás vezes como depois de eu morto
certos objectos do meu uso irão chorar por mim.
Essas saudades deles comovem-me
de modo que sinto até já saudades minhas.
Afonso Lopes Vieira
PINHAL DO REI
Catedral verde e sussurrante, aonde
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o "Lavrador" que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim...
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
rei D. Dinis, bom poeta e mau marido,
lá vem as velidas bailar e cantar.
Encantado jardim da minha infância,
aonde a minh'alma aprendeu;
a música do Longe e o ritmo da Distância
que a tua voz marítima lhe deu;
místico órgão cujo além se esfuma
no além do Oceano, e onde a maresia
ameiga e dissolve em bruma,
e em penumbra de nave, a luz do dia.
Por estes fundos claustros gemem
os ais do Velho do Restelo...
Mas tu debruças-te no mar e, ao vê-lo,
teus velhos troncos de saudades fremem...
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
são as caravelas, teu corpo cortado,
é lo verde pino no mar a boiar.
Afonso Lopes Vieira
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